terça-feira, 24 de julho de 2012

Um Outro Olhar - Por Michelle Ferret

 
 
Reconhecer o vazio. A semelhança. A saudade e a cidade. Tudo isso se misturava dentro dela enquanto vivia. Mas a realidade é que o pequeno espaço de vento poderia mudar tudo dentro dela. E não a cidade. Isso era apenas um detalhe na imensidão que era e ainda é a sua pequena vida. Um cheiro de mar vinha da cozinha. Era a casa de sua tia. Àquela que a criou enquanto menina, gostava de rodar léguas para apanhar peixinhos. Nunca trouxe nenhum. Todos ficavam nadando solitários em sua memória. Quase sem trégua o horizonte vazava a manhã e deixava nascer mais um pedaço de dia.
Menina esquisita. Pernas tortas. Pés pálidos e olhos de gente já velha. Seus cabelos pareciam embolados a um estreito prendedor de rosas claras. Ela era toda estranha. Nada a fazia ter simetria com qualquer mulher de qualquer mundo.
E os desejos ambulantes e latentes de desvendar o tudo, a guardavam da escuridão de ser gente. Ela não parecia ser gente. Parecia ser qualquer coisa que não cela. Qualquer coisa que não se prendia nem retorcia miragens. Qualquer parto difícil de acontecer. Era ela. Aquela pequena porção de estranheza e solidão que se revelava como qual enquanto dormia. Ou não. Não precisava nem dormir para deixar revelar o que sentia.

Acendeu a vela e foi olhar a rua.

Tudo aceso. Parecendo dia. Mesmo madrugada. Ela acendia. Gostava de velar as coisas. De deixar-se velar para que o mundo a visse em fragmentos iluminados. E nada era preciso. Tudo aos poucos e retalhados. Era ela. 
 
 

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CORUJAS E PITANGAS