A Mão e a Luva - Os movimentos do coração não estão nas mãos da vontade...
Não li Machado de Assis por ordem dos professores, nem como uma obrigação para aprender literatura.
Meu encanto se deu só aos vinte e poucos anos, numa rua deserta e era um domingo.
Vi um livro de capa dura dourada pendurado por uma corda em frente a uma banca de jornal.
A promoção da editora Globo chamou minha atenção. O ano era 1997.
A promoção da editora Globo chamou minha atenção. O ano era 1997.
"Há no amor um gérmen de ódio que pode vir a desenvolver-se
depois. Talvez chegues a
acusá-la de te não querer; nesse dia reflete que os
movimentos do coração não estão nas mãos da vontade. Ela não tem culpa se outro lhe despertou o amor.
- Ah! Incumbiu-te da defesa!
Luís Alves sorriu; ele contava com a recriminação.
- Não, não me incumbiu da defesa, disse ele; sou eu que a
tomo por minhas mãos. Que
defendo eu aqui senão a natureza, a razão, a lógica dos
sentimentos, dura e inflexível como toda a outra
lógica? Há no fundo das tuas palavras um sentimento de egoísmo..."
Esqueci o que acontecia ao meu redor durante os dois dias em que devorei o livro.
E eu voltei lá na banca muitas outras vezes!
Um pouco da história do livro
A mão e a luva é um dos romances de Machado de Assis, publicado em 1874.
Incrível a diferença no rítimo e narrativa entre este que é o segundo
livro de Machado e "Memórias póstumas...". A Mão e a Luva é
perfeitamente sintonizado com o Romantismo entretanto é possível
perceber entre a estrutura clássica do romance, as características que
farão de Machado nosso verdadeiro bruxo do Cosme Velho! A conversa com o
leitor e o sarcasmo mostram-se, ainda que timidamente, como em:
Estevão, vendo-se abandonado e rejeitado começa a se iludir pensando
que tudo não passa de um teste do ser amado: "A imaginação de Estêvão
desceu por este declívio de floridas conjecturas, e Luís Alves entendeu
que era de bom aviso não espantar-lhe os cavalos. Ela foi, foi, foi por
ali abaixo, rédea frouxa e riso nos lábios. Boa viagem!" "A careta que
fez ao sair ninguém lha pôde ver, e não se perdeu nada." "as aparências
de um sacrifício valem mais, muita vez, do que o próprio sacrifício"
A obra tem também um quê de pessimismo, ou ao menos, uma desilusão
com o caráter humano. O enredo trata de uma garota determinada e segura
de si, de origem humilde e simples que se vê a "fortuna" dar-lhe
oportunidade de ascender socialmente e busca manter-se assim após (ou
através de) o casamento. È prentendida por três: O sincero e romântico
Estevão, que carrega em si todos os esteriótipos dos heróis Românticos,
sendo tratado pelo narrador como apaixonado e sincero, porém patético. O
previsível, vazio e medíocre Jorge, muito próximo à menina porém sem
brilhantismo. E o astuto e ambicioso Luís Alves (único com nome e
sobrenome!), homem sóbrio determinado, com aspirações políticas e
sociais fortíssimas. Frente a isso, a união entre a menina Guiomar e
Luís Alves, é tão certeira como o ajuste entre a Mão e a Luva!
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